quinta-feira, 25 de junho de 2009

QUANDO ME CANDIDATARAM A VEREADOR...

(Dizem que isto realmente aconteceu na região de Morrinhos na década de 60)

Reporto-me a um tempo em que eleições eram um acontecimento que mexia com a cidade e com os seus eleitores, de um modo diferente do de hoje.
Não tínhamos rádio e nem televisão para divulgar as nossas propostas ou nossa plataforma de trabalho para o cargo pleiteado.
De modo que tudo era feito no corpo a corpo, nos comícios e nas galinhadas e festas pré-arranjadas para determinado candidato.
Naquele tempo não tínhamos o material de campanha que hoje se dispõe, tais como santinhos, bandeiras, banners e tantas outras maneiras de divulgação do candidato.
Mas o que eu quero relatar aqui – acontecimento da época a que me referi – é de quando me candidataram a vereador.
Digo me candidataram porque, a princípio, eu não queria de jeito nenhum! Achava eu que não tinha “jeito” para coisa e tantas outras limitações que me prendiam à vidinha calma e tranqüila que eu levava.
Mas, a insistência foi tanta, os argumentos foram tão convincentes, que resolvi aceitar o desafio.
Partimos para o registro de candidatura... Me arrumei todo para tirar a fotografia que serviria, dentre outras coisas, para figurar no cartaz, diga-se de passagem, em preto branco, para ser afixado nas paredes, nos muros, nas casas, nas árvores, porteiras e moirões da zona rural.
Minha primeira decepção... A foto não ficou parecida comigo, em nenhuma época de minha vida. E como não se tinha o recurso dos foto-shops de hoje, ficou daquele jeito mesmo.
Pois bem, de posse daquela horrível estampa 30 X 50 cm, impressa em papel mais ruim do que a foto, uma lata de bom grude de polvilho – sim! Grude de polvilho, caro leitor e eleitor – saí, a princípio para a zona rural para “pregar” aquele papel nas principais estradas e também porque eu era candidato representando esta classe trabalhadora.
Minha primeira parada, ainda de madrugada, na venda de um grande conhecido meu, que ainda nem tinha aberto as portas de seu comércio para os fregueses.
Eu pensei... Melhor assim! Quando ele for abrir as portas vai ver, com certeza, a minha propaganda e vai botar reparo detalhado na questão.
Eu levava comigo um funcionário de minha fazenda para me ajudar e disse a ele: “Você vai ter a honra de pregar o primeiro cartaz da minha campanha.” Peguei o papel, besuntei abundantemente o danado de grude e entreguei-o para o meu ajudante e este se dirigiu à porta de madeira da venda, com a recomendação de que não fizesse barulho.
Cartaz afixado... Segunda decepção... Meu ajudante pregou o dito cujo de cabeça para baixo... E não tinha como arrancá-lo e consertar o ocorrido. Quem já utilizou este método “grudento” para afixar alguma coisa, sabe que não é possível esta operação, levando-se em conta a qualidade do papel empregado e alta viscosidade da “cola” de polvilho que se esta usando. E não podíamos pregar outro porque um cachorrão boiadeiro já se dirigia no rumo de meu ajudante para tomar satisfações daquela invasão.
O jeito foi deixar assim mesmo...
Mais a frente, deparamo-nos com bela porteira de tábuas, com moirões de aroeira bem trabalhados, e eu disse a meu ajudante:
-Você não sabe pregar cartaz, deixe que este eu vou pregar.
-Prepare o “bicho!” bem melecado.
Lá vou eu com o cartaz na mão... Subi nas tábuas da porteira para colar a propaganda onde ficasse difícil alguém retira-la. Na ultima tábua do equipamento, resolvi colocar o dito cujo no mourão da porteira, lá bem no seu começo e na face contrária a mim, pois era o lado que a porteira abria e então as pessoas teriam mais tempo para visualizar a minha propaganda.
Mandei ver... Com toda empolgação do mundo... ploft.
Terceira decepção: tasquei o cartaz bem em cima de uma caixa de marimbondos tatu que, sentindo-se incomodados- não sei se pelo grude, pelo papel, pela foto ou até pela finalidade daquele ato – “freveram” em cima de mim. Tomei bem uma meia dúzia de ferroadas que me provocaram, além da dor com íngua, me levaram a seguinte reflexão: Será que Deus esta me avisando pra eu desisti desta candidatura? Será que política é coisa do “coisa ruim”?
Toquei em frente pensando naquilo e quando cheguei na minha fazenda, fui conversar com as pessoas mais entendidas, mais vividas no assunto.
Todas foram unânimes em afirmar:
-Que é isso, Coronel, Deus ta é testando a sua força de vontade, a sua perseverança... não desiste não! Nóis vai tudo votar no Senhor!”
-É, sendo assim vou me engajar de corpo e alma nesta empreitada.
-Ceis tem alguma idéia para me ajudar?
-Oia Coronel, o Senhor tem que treinar um discurso para falar no comício.
- Vixe! Danou-se! Não sei nem segurar num microfone... Quanto mais falar naquilo...
- Então o Senhor tem que ensaiar, praticar aqui mesmo na fazenda, pra nois, se for o caso.
- Nem proceis eu tenho coragem de falar! Credo em cruz! Só de pensar, já me bambeia as pernas.
- Então o Senhor tem que praticar sozinho... Imaginando que esta falando para uma grande multidão. Dá certo, num dá?
-É, pode funcionar...
Depois do almoço, arriei a minha mulona e fui me embrenhando nas matas para ficar bem escondido e ali praticar o recomendado, somente com a presença de passarinhos, formigas e cupins.
E foi num desses cupinzeiros, o maior e mais alto de todos, que apeei da minha condução e subi no dito cujo, com a rédea da mula devidamente envolvida no meu braço, senão ela, num lampejo de crítica, poderia me deixar falando sozinho ali naquela capoeira e aí eu iria realmente ficar no mato sem cachorro.
Devidamente posicionado e já antevendo “aquela multidão” na minha frente, com destaque até para uma moça bonita que sorria maliciosamente para mim, fitei a todos nos olhos, enchi o peito de ar, passei a mão no cabo do relho, como se fosse o desgraçado do microfone, ergui bem alto os braços e...
Quarta decepção... A mula se assustou com aquela levantada brusca dos meus braços e correu para trás, me puxando de cima do cupim com tamanha violência que acho que “apaguei” por uma meia hora, estatelado ali no chão.
Quando “acordei”, pra minha sorte (eu merecia pelo menos uma sorte, não?) a mula estava ali parada olhando para mim com uma cara tão “lavada” que eu até lembrei daquela mocinha do meu público, que já tinha ido embora, e então pensei em voz alta:
- Pro diabo esta candidatura! Não vou mexer com isso não!
A vida prosseguiu e parentes e simpatizantes da minha candidatura tocaram a campanha mesmo sem a minha concordância e...
Quinta decepção: FUI ELEITO, SENDO O SEGUNDO VEREADOR MAIS VOTADO DO MUNICIPÍO!!!!
Até hoje não sei se a sexta decepção foi para os que votaram em mim e se foi no dia em que eu tive que representar o Presidente da Câmara e tive que falar um discurso...
Bem, mas aí já é uma outra história...

Paulo Tárcio Martins
Membro do Rotary Club de Morrinhos
Membro da Academia Morrinhense de Letras
Assessor de Gabinete do Vereador Tércio Gonçalves de Menezes

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